O problema da psicopatia é algo sobre o qual muitos autores da área da Psicologia têm se debruçado ultimamente, buscando realçar suas características e sua presença na sociedade. Mesmo o cinema já retratou vários desses tipos e a tv apresenta muitos seriados com esse tema. Existem séries específicas sobre personagens psicopatas.
O que parece certo para os estudiosos dessa patologia é que cerca de 4% da população apresenta traços de psicopatia. Entre os prisioneiros, este número sobe para 15%.
Na verdade, a psicopatia possui vários graus. Nem todo psicopata é um assassino em potencial. No entanto, há algumas características que são comuns a todos eles. Se fôssemos destacar a mais marcante, poderíamos assinalar a total ausência de culpa ou remorso. O psicopata é capaz de prejudicar uma pessoa sem sentir o mínimo de inquietação na consciência por isso.
Desde que comecei a estudar o assunto, passei a observar o comportamento das pessoas, tentando identificar quais apresentavam traços de psicopatia. É surpreendente, e ao mesmo tempo revelador, descobrir que pessoas que conviviam comigo há tanto tempo eram, provavelmente, em algum grau, psicopatas. Digo que é revelador, porque isso também explica muitas atitudes delas que antes pareciam incompreensíveis para mim.
Mas pensando de uma maneira mais ampla, o número de psicopatas na sociedade atual me parece bastante alto para algo que deveria ser uma exceção mínima no comportamento social. Tenho dúvidas se realmente tantas pessoas são psicopatas ou se elas simplesmente não estão aprendendo a agir como um. Na verdade, o que observo é que mesmo pessoas que, normalmente, não apresentam um quadro de psicopatia, vez ou outra tomam atitudes ou assumem características típicas dos psicopatas.
A pergunta que faço é: não seria a nossa cultura moderna psicopática? E por ela ser assim, não estaria ocorrendo de mesmo pessoas que não sofram da psicopatia como patologia acabarem por absorver algum tipo de comportamento que se assemelha ao de um psicopata?
Minha pergunta foi, então, foi respondida por um cientista, estudioso da ponerogênese (origem do mal), Andrew Lobaczewski, que escreveu em seu livro “Ponerologia”, o seguinte:
“Toda pessoa, no decorrer de sua vida, e particularmente durante a infância e a juventude, assimila material psicológico das demais pessoas através de ressonância mental, identificação, imitação e outros meios de comunicação, em seguida transformando tudo isso para construir sua própria personalidade e visão de mundo. Se tal material é contaminado por fatores patológicos e deformidades, o desenvolvimento da personalidade também pode ser deformado. O produto será uma pessoa incapaz de entender corretamente tanto ela mesma como outras pessoas, tanto as relações humanas normais como as morais Ela se desenvolve para ser uma pessoa que comete atos maus com um sentimento medíocre de deficiência”.
Se assumirmos a hipótese de Lobaczewski como verdadeira e tentarmos rastrear onde poderia ter começado a se infiltrar na cultura ocidental essas características psicopáticas, poderíamos arriscar que quando ela começou a combater o cristianismo frontalmente, tentando negá-lo ou, pelo menos, lançá-lo para fora da esfera pública, foi quando a cultura começou a desenvolver a psicopatia como uma de suas características.
Explico: o cristianismo sempre tratou com a questão da culpa e do arrependimento. Um cristão é instado a se avaliar ininterruptamente a fim de perscrutar seus verdadeiros motivos para que, detectando seus erros, possa arrepender-se a fim de ser perdoado por Deus. É claro que a proposta cristã é de superação da culpa pela graça. No entanto, nem sempre as sociedades cristãs souberam equilibrar isso muito bem. Seja no período pós-apostólico, em diversos momentos do medievo, nas comunidades puritanas, na Inglaterra vitoriana e outras tantas formas que o cristianismo se manifestou, a impressão que eu tenho é que a culpa ocupou um lugar de maior destaque do que a graça e aquela frase de Paulo, que disse que onde abundou o pecado superabundou a graça, parece não ter tido um efeito tão evidente nelas.
Em determinado momento histórico, quando setores da sociedade começaram a contestar a visão cristã do mundo, um dos primeiros dogmas que tentaram se livrar foi exatamente o da culpa. Cansados de lutar contra a acusação cristã de que todos são pecadores e naturalmente estão condenados, sem compreender a própria solução que o cristianismo oferece da graça divina, escolheram simplesmente negá-la, afirmando que o homem não deve se prender aos remorsos de seus erros, mas superá-los pela liberação da consciência.
Chegamos então ao mundo pós-moderno, onde uma das frases mais ditas, típica de um psicopata, é: não me arrependo de nada que fiz. Uma sociedade que preza pelo sucesso a qualquer custo, que ensina que o que importa são os fins a serem alcançados, que educa seus filhos a cantar que cada um deles não deve olhar para trás e nem se arrepender do que faz, reflete ou não as características comuns aos psicopatas?
O que eu quero dizer é que talvez esse número de psicopatas clínicos nem seja tão grande assim. O que ocorre é algo muito mais perigoso: vivemos em uma cultura que tem características psicopáticas e que, por isso, mesmo pessoas que não sejam psicopatas, como forma de se adequar nesta sociedade e conquistar a ascensões sociais possíveis dentro dela, acabam por introjetar as características psicopáticas existentes nela. E quem vai negar que a ausência de remorso, o narcisismo, a responsabilização alheia, o individualismo, a bajulação e a necessidade de estímulos constantes são características da sociedade atual? Bem, são exatamente estas as características de um psicopata!
Kerry Daynes e Jessica Fellowes, duas estudiosas inglesas da psicopatia, concluem que boa parte dos políticos e empresários conhecidos devem ser psicopatas. Mas, pensando bem, talvez estes apenas tenham se adaptado melhor à própria sociedade onde vivem.
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