Uma censura cordial

As Guerras Mundiais, a Guerra Fria e a ameaça de holocausto nuclear condenaram o discurso político incisivo. Tornou-se pecado falar com firmeza e tratar o adversário como inimigo. Começou-se a exigir que todo orador buscasse o equilíbrio e a razoabilidade.

Em tese, as intenções pareciam boas. Contra o que C. Wright Mills chama de realismo excêntrico, principalmente dos conservadores, passou-se a exigir que a linguagem e expressão fossem adornadas com vestes de tolerância. Tendo como base a ideia de que cada um tem uma maneira própria de enxergar a vida, a linguagem dos novos tempos deveria superar a dualidade entre o certo e o errado, mas considerar as ideias alheias como alternativas plausíveis.

A Nova Retórica, de Chaim Perelman, tornou-se um dos estandartes dessa nova expressão. Sua ciência é uma verdadeira filosofia da concórdia, uma tentativa por criar uma ponte entre os espectros ideológicos.

O problema é que a vida real é sempre mais complicada do que as melhores boas vontades. Enquanto os conservadores passaram a moderar seu discurso, a fim de adequar-se às exigências dos novos tempos, os progressistas passaram a usar essa mesma forma de expressão, aparentemente cordial e tolerante, para calar seus adversários políticos. No fim das contas, a linguagem polida dos progressistas tornou-se como arma mortal escondida dentro de um buquê de flores.

O que era para ser uma maneira de aproximar os extremos censurou um lado e fortaleceu o outro.

Depois de três décadas dessa nova filosofia do discurso, o resultado é que os conservadores não podem mais se expressar. Se falam do seu jeito, tentando mostrar as coisas como são, são tachados de radicais; se amenizam seu discurso e procuram mostrar-se tolerantes, acabam absorvidos por seus adversários políticos, que assumiram essa forma de expressão aparentemente cordial como sua marca registrada.


Comentários

Uma resposta para “Uma censura cordial”

  1. Avatar de Ricardo Luís Lopes Kfouri
    Ricardo Luís Lopes Kfouri

    Prezado Professor Fábio, mais um texto bastante direto e elucidativo. Muito obrigado!

    Interessante que ontem me deparei com o texto do Professor Francisco Razzo, publicado na Gazeta do Povo (https://www.gazetadopovo.com.br/colunistas/francisco-razzo/direita-nao-tema-dizer-seu-nome/), e ele, pelo que entendi, critica o que ele denomina de “conservador revolucionário”.

    Sei que o conservadorismo está muito acima de muitas das discussões de hoje, mas não é fácil ficar de fora…rs

    Abraço,

    Ricardo Luís Lopes Kfouri

Deixe uma resposta

Newsletter

Digite seu endereço de e-mail para receber notificações sempre que um novo conteúdo for publicado neste site

Junte-se a 222 outros assinantes