Não é possível negar a influência que as ideias marxistas tiveram em todo o mundo. Além dos países que viveram ou ainda vivem sob governos explicitamente marxistas, como os comunistas propriamente ditos, mas também os socialistas das mais diversas vertentes, há um avanço que vai para além da política, que invade a cultura, fazendo com que o pensamento de Marx seja reproduzido nas universidades, nos meios artísticos, jornalísticos e até na indústria do entretenimento.
A pergunta que deve ser feita, porém, é: como uma ideologia fundamentada em textos de um pensador medíocre, que errou praticamente todas as suas previsões, intelectualmente desonesto e que criou uma filosofia que não passa de um arremedo materialista do idealismo hegeliano, pôde influenciar tanta gente?
Uma das respostas é dada pelo escritor brasileiro Heraldo Barbuy, que, em seu livro ‘Marxismo e Religião’, foi taxativo ao afirmar que “o marxismo não era ciência, e sim religião; indiferente aos fatos que o contradizem, progrediu como fé“. O que ele defende é que o marxismo se mantém cada vez mais forte simplesmente porque possui aspectos maiores do que meramente políticos; é, na verdade, uma seita pseudo-religiosa. Mesmo com os erros de previsão, mesmo com as análises eivadas de incongruências, ele permanece porque o cerne de sua força não está em suas ideias, mas em seu espírito – um espírito de fé.
Se nós observarmos bem, identificaremos claramente esses elementos religiosos listados pelo senhor Barbuy. Por exemplo, como em toda seita, no marxismo, a correção lógica, a rigidez filosófica ou a comprovação dos dados oferecidos são dispensáveis. Podem ser úteis para dar uma aparência científica às suas teses, mas o que vai manter a ideologia viva será sempre a manutenção do fervor religioso e do apego emocional à crença ideológica.
Outra característica típica de seita é a existência de profetas fundadores ─ e esta é a posição, de fato, que ocupam Marx e Engels. Eles, como bons profetas, foram os responsáveis por transmitir suas visões sobre os tempos futuros, apontar as mazelas do presente e prognosticar sobre os últimos dias. Se erraram quase tudo que previram é um detalhe que todas as outras seitas também incorreram e, da mesma forma, sobreviveram. Como Leon Festinger ensina em relação à dissonância cognitiva, a fé na doutrina se fortalece exatamente quando ela se prova mais equivocada.
O marxismo também mostra-se religioso quando apresenta uma promessa, disfarçada de previsão: a do advento de um paraíso vindouro. À semelhança do céu cristão, o futuro comunista é o tempo quando os males cessarão, a harmonia prevalecerá e os aspectos opressores do tempo presente não mais terão força. Até um certo saudosismo de uma Era de Ouro, nesse caso em uma interpretação tosca do paraíso adâmico, existe nos escritos de Marx, Engels e outros de seus apóstolos. Para eles, também com alguma semelhança com o Reino celeste de Cristo, o futuro paradisíaco comunista será um tempo além da história, quando os aspectos que afetam o presente não mais terão efeito.
Os elementos religiosos do marxismo não param por aí e ele apresenta seu próprio livro sagrado – no caso, ‘O Capital’, d Marx. Todo marxista o tem como uma descrição perfeita da realidade e o usa como modelo para a interpretação das relações econômicas na sociedade. Não importa que essa obra tenha sido desconstruída por diversos pensadores. Lembre-se: marxismo é religião e sempre há um argumento para justificar os aparentes erros de seu escrito sagrado.
Para manter a fé de seus seguidores, como é comum a qualquer religião, o marxismo também gerou o seu próprio diabo. No caso, os demônios são os capitalistas. Da mesma forma que o diabo obscurece o entendimento do homem, para que não perceba sua condição de pecador necessitado de redenção e cura, o proletariado oprimido é alienado pelo capitalista que, por meio de seus métodos, impede que ele perceba o seu estado de alienação e busque a redenção por meio da consciência de sua posição e pela luta contra essa classe opressora.
Até as fragilidades das religiões o marxismo apresenta, como o fato de fragmentar-se em novas seitas, variações, partidos e dissensões. Ainda assim, como é comum também às religiões, a despeito dessas divisões cindirem o movimento, de alguma maneira, a homogeneidade ideológica se mantém intacta, preservando um núcleo de fé inabalável.
Não é por acaso que é tão difícil convencer um marxista que a ideologia que ele professa é uma fraude. Ninguém abandona sua fé por causa de argumentos racionais contrários a ela. Afinal, uma crença religiosa amarra o fiel pelo espírito, pela promessa, pelo sonho. Um militante marxista pode ter todos os argumentos do mundo para justificar sua adesão (como todo religioso o tem em relação à sua própria fé), mas é certo que eles não passam de uma fachada racionalizante para algo muito mais profundo: a necessidade de fazer parte de uma causa maior. No caso, a causa socialista.
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