O que o politicismo integral revela

img_1521O Brasil politizou-se. Pelo menos essa é a impressão quando vemos tantas pessoas discutindo sobre os assuntos políticos do momento. Talvez não tenha alcançado, ainda, aquele estágio de consciência necessário para achar-se como um país maduro, no entanto, não há como negar que, há algum tempo, neste país praticamente não se fala de outra coisa além de política.

Isso, porém, diferente do que pode parecer em um primeiro momento, é um sinal evidente que vivemos um período sui generis, quando as questões políticas estão tão em evidência que é praticamente impossível fugir do assunto. E essa realidade acontece, principalmente, em momentos de crise. Apenas quando as questões políticas estão fugindo de sua normalidade é que as pessoas, que normalmente são desinteressadas, começam a falar sobre elas.

Tal situação ainda evidencia que o Estado, por meio de seu estamento burocrático, está excessivamente em evidência, penetrando em todas as áreas da vida comunitária. Quando o governo é o assunto de todos, isso é sinal que ele sobrepujou em muito suas funções essenciais. Não é por acaso que o Estado fica mais em evidência exatamente em tempos de guerra, nos governos fascistas e de exceção e, como agora acontece no Brasil, quando foi colocado em marcha um projeto de poder que pretende dominar tudo.

O governo ideal é aquele, como dizia Ronald Reagan, que menos atua, que menos atrapalha a sociedade. Quando isso acontece, a preocupação das pessoas pode, sem esquecer da dimensão política que, em alguma medida, sempre é necessária, voltar-se para outros temas mais elevados e edificantes. Quando vemos, porém, que, mesmo as pessoas menos notoriamente preocupadas com política, começam a falar sobre ela, o tempo todo, isso é uma clara demonstração que a vida no país está desorientada.

Muita gente acredita que esse surto de discussões políticas é fruto de um amadurecimento da consciência nacional, mas isso é um engano. Se está todo mundo falando sobre ela é mais porque todos estão sentindo os efeitos dos atos governamentais em suas vidas particulares do que por um interesse espontâneo que possa ter surgido, de repente, em cada um. A explosão de debates sobre política é a prova que o rabo de Leviatã está batendo longe demais.

É claro que a forçada participação política acaba gerando, em muitas pessoas, maior entendimento da situação do país e, nesse sentido, a presente situação pode até ser considerada útil. No entanto, há um efeito colateral nisso tudo, que é transformar as pessoas em integralmente políticas. O politicismo integral é característica, como dizia Ortega y Gasset, do homem-massa. Ele fica tão embuído disso, que não consegue enxergar nada além da política, contaminando tudo com ela. E quando isso acontece, ele acaba perdendo, ainda segundo o pensador espanhol, sua capacidade de religião e conhecimento.

Do outro lado, o homem de consciência elevada, que sabe se manter à parte da contaminação da multidão, releva a política como uma necessidade a ser suportada, porém mantendo ela em seu devido lugar, sem deixá-la invadir outros assuntos mais importantes. Quando, porém, vemos, mesmo pessoas de notória erudição, falando o tempo todo sobre política, temos a certeza que vivemos um momento muito difícil em nosso país. E isso só acontece porque o grupo que está no poder é tão megalomaníaco e tão arrogante que não pretende deixar de fora de sua atuação qualquer área da vida das pessoas. Não contente de contaminar a própria política e a relação com os empresários do país, ele se mete na cultura, na educação, nas relações familiares, na religião e até nas preferências e gostos mais particulares dos indivíduos. Quando as coisas chegam a esse ponto, não há como, mesmo para aquelas pessoas normalmente mais preocupadas com outras matérias, terem de, o tempo todo, emitir suas opiniões políticas.

Por isso, se queremos resgatar a cultura e a espiritualidade em nosso país, antes é preciso colocar a política em seu devido lugar, como uma chatice que precisamos entender e acompanhar apenas no limite de sua importância burocrática. Isso porém só vai ocorrer quando os grupos que disputam o poder deixarem de ser aqueles que a tudo pretendem dominar. Enquanto esses tiranetes ainda estiverem por lá, estaremos condenados a falar de política o tempo todo.

Espero que chegue o dia quando a política vai deixar de ser o principal assunto de nossas conversas, escritos e ensaios e então saberemos que estaremos vivendo em um país normal, onde as coisas mais elevadas podem ser tratadas como mais importantes e com mais assiduidade e as disputas políticas podem ser deixadas como uma mera contingência da vida em sociedade.

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