O que há de errado em nossa democracia

Quando nos deparamos com o resultado de uma eleição, como a brasileira do último domingo, não há como escapar do pensamento: o que deu errado com a nossa democracia? Como um povo pode estar tão submetido a um governo tão manipulador e corrupto, a ponto de escolhê-lo para continuar no poder, dando praticamente carta branca para que ele permaneça com sua atuação ditatorial e dilapidadora do patrimônio nacional?

Ainda que concordemos que a democracia é o melhor sistema de governo que existe, não podemos nos furtar de perguntarmo-nos: por que ela não está funcionando no Brasil? Aliás, também não está indo nada bem na Venezuela, na Bolívia, na Colômbia e na Argentina. O que há de tão peculiar neste canto do mundo para ser tão difícil que a normalidade seja a regra e não a exceção.

A resposta, de qualquer forma, não é tão complicada. Uma democracia pressupõe um povo livre e consciente. Para poder escolher seus representantes, os homens de um país não podem ser servos de ninguém, não podem ser submissos aos governos, na verdade devem ser donos de seus próprios narizes. Também é necessário que tenham a mínima possibilidade de entender a vida e a sociedade. Não precisam ser experts, mas precisam possuir ao menos uma elementar capacidade de compreensão das coisas.

No Brasil, mais especificamente, é notório que apenas uma parcela ínfima da população entende o que está ocorrendo. Grande parte não possui instrução mínima para compreender isso e uma parte maior ainda sequer sabe ler, pois é analfabeta funcional, quanto mais analisar alguma coisa que não sejam as questões mais imediatas da vida cotidiana. Aqui, a cultura está deteriorada, tornando o imaginário das pessoas absurdamente restrito. Somos uma multidão de idiotas, colocados à parte da vida política, menos por desinteresse do que por inépcia.

A população brasileira pode ser considerada, em sua maior parte, como incapaz – juridicamente incapaz. Como para responder pelos seus atos é preciso ter consciência de suas consequências, talvez a maioria das pessoas deste país não possa sequer ser considerada apta para o exercício da cidadania. São ineptas, simplesmente.

Um povo que está nesse nível, obviamente, está sujeito à manipulação. Todos os slogans governamentais, toda propaganda mentirosa, toda indução são absorvidos facilmente por ele. Assim, quando exerce, por exemplo, seu direito a voto, não é sua vontade livre que se manifesta, mas um impulso que vem de suas entranhas, estimulado por sensações irracionais, semelhante a instintos, invariavelmente provocadas desde fora.

Uma democracia onde as pessoas são assim não pode funcionar corretamente. Um país onde 25% das pessoas são dependentes diretas do governo, recebendo dele benesses sem contrapartida, onde existe um universo de funcionários públicos sujeitos às ordens governamentais, onde há outros tantos beneficiários dos mais diversos programas estatais, onde os empresários precisam implorar para que o Estado alivie suas dívidas, senão certamente vão à bancarrota e onde o cidadão comum trabalha 4 meses para quitar suas obrigações tributárias, certamente não é um país formado por pessoas livres.

E a liberdade é essencial para a democracia. Sem liberdade o senso de direção fica prejudicado e a visão sobre o que é melhor para a nação fica turva. Mas apenas é livre quem é dono de si mesmo, quem não precisa mendigar nada para os outros, quem pode decidir o que é melhor para sua vida. Quando nasceram os Estados Unidos da América, a democracia moderna surgiu também. Mas lá quem formou o país foram homens livres, donos de suas terras, senhores de sua fé, portadores de suas armas. Ali, a vontade dos homens, em uma conciliação livre, podia ser praticada. Havia, de fato, um governo que refletia a vontade de uma maioria que sabia exatamente o que queria. Não é por acaso que apenas homens com certo status social e possuidor de determinadas posses eram aptos a votar. Não que eu defenda isso para os nossos tempos, mas vale para entendermos a razão por que as coisas eram daquela maneira. Longe de um elitismo preservador de privilégios, o entendimento é que para decidir sobre o destino da nação os homens precisavam ser livres, antes de tudo, e terem, ao menos em tese, a capacidade de compreender a realidade.

Que isso nos alerte para uma coisa: nossa democracia atual é apenas um arremedo de uma verdadeira democracia. Se o povo não é livre, nem consciente, ainda que tenha seu direito a voto, isso não passa de uma mera formalidade que tem o objetivo de legitimar um sistema mentiroso, que finge responder ao anseio da maioria, quando apenas serve para a manipulação de um pequeno grupo. Em uma democracia assim, tudo é artificial, falso, enganoso.

Por isso, antes de lutar por democracia, uma nação deve ter como principal objetivo a luta pela liberdade e pelo desenvolvimento da consciência. Pois, sem liberdade suas escolhas serão sempre suspeitas e sem consciência serão invariavelmente estúpidas.


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