Diante de meus textos anteriores, sobre a impossibilidade de moderação do religioso, um questionamento de um leitor torna-se bastante pertinente. Ele me pergunta se, então, não podemos exigir moderação de grupos radicais, como alguns islâmicos, que têm agido de forma extrema, impondo seu terrorismo em muitos lugares do mundo.
A resposta a essa questão é, de fato, muito simples: é impossível exigir moderação deles. Isso porque todo ato de convicção se dá pela crença de sua virtude intrínseca. Quando eles matam, queimam, decaptam aqueles que chamam de infiéis, creem, verdadeiramente, que suas ações são boas, dentro de suas perspectivas religiosas. Acreditam mesmo que estão fazendo um bem, ainda que aos olhos de todo o restante do mundo seus atos sejam maus.
Se, portanto, um religioso não pode moderar-se e, como vimos anteriormente, um secularista também não, querer exigir o refreamento de suas convicções será absolutamente inócuo. Não se pode esquecer que cada um deles se vê como o defensor do bem maior, das virtudes supremas, do que há de mais nobre na vida.
Portanto, o que deve ser questionado não é a atitude que cada qual tem em relação a sua própria convicção, mas a convicção em si mesma. É ela que deve ser julgada, ela que deve ser medida.
O problema é que todo julgamento exige um padrão, um senso comum, uma referência superior que sejam aceitos por todos os envolvidos. Porém, neste mundo relativista, onde cada um se acredita possuidor de uma verdade autônoma, essa noção se perdeu e os debates se tornaram impossíveis.
Resta, então, apenas a luta, a tentativa de conquistar mentes e corações para a causa na qual acredita e persuadir os outros de que suas próprias convicções são superiores e mais benéficas para toda a sociedade.
Por isso, a vida política, a despeito de sua forma exterior, está longe de ser um centro de debates. O que existe, de fato, é uma disputa por angariar adeptos, converter os indecisos e vencer os opositores. E nessa luta se, em algum momento, alguém cede, não faz isso por concessão benevolente, mas, meramente, porque entende que, naquele momento, tal atitude é o melhor para sua causa.
Por tudo isso, deixo um recado para os religiosos que estão envolvidos nas disputas políticas, em todos os níveis: jamais permitam que os padrões dos opositores sejam os mediadores dos debates. Fazer isso é já começar a batalha sendo derrotado. O que normalmente está em discussão são duas visões de mundo em conflito e que são inconciliáveis. O objetivo deve ser, portanto, não convencer o adversário, mas trazer para seu lado os vacilantes.
Entendam também que qualquer cessão que a outra parte fizer não é aceitação do ponto de vista de vocês, mas apenas uma estratégia que ela entendeu conveniente em determinado momento. Por isso, não se sintam obrigados a ceder se isso não lhes for conveniente.
Nem se incomodem com as manifestações de indignação, normalmente histriônicas, que os secularistas costumam demonstrar em público. Isso é tudo teatral. Lembrem-se que a única coisa que os indigna é não poder impor suas aberrações e morbidezas para todos.
E esqueçam os rótulos. Fanático, fundamentalista, radical, extremista são apenas figuras de linguagem usadas estrategicamente para enfraquecer o ímpeto do adversário e fazer com que os observadores se sintam desconfortáveis em ficar ao lado deles. Tudo isso é apenas jogo de cena. Eles mesmos sabem que, na defesa de suas convicções, são tão radicais quanto qualquer revolucionário na história.
E apenas para responder a meu leitor: em relação aos terroristas islâmicos, não é moderação que devemos exigir, mas combatê-los frontalmente, combater a própria fé que professam, impedindo-os de agir de acordo com aquilo que eles acreditam.
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